terça-feira, 3 de maio de 2011

A ESCOLA TRADICIONAL E OS “EFENÓLOGOS”

Por: Edvaldo Cavalcante - Lembro-me como se fosse hoje, tinha um garoto na minha sala (uma turma de sétima série) que era o que chamávamos de “crânio”. Tirava notas estratosféricas, era o primeiro da turma, sempre invejado. O que me intrigava era que, numa conversa informal, ele parecia ser bem menos instruido do que as suas notas indicavam. Alguns anos depois encontrei com ele trabalhando em um mercadinho como embalador. Perguntei: E a faculdade, conseguiu?” Ele, com tom de melancolia, disse: Que nada, não passei. Agora trabalhando aqui não dá pra estudar”.


Fiquei um bom tempo sem entender porque o cara que tirava notas altas não havia seguido adiante nos estudos. Anos depois, numa aula de didática com a querida professora Hajnalka (acho que é assim que se escreve esse nome húngaro), aprendi que a escola tradicional criava falsos heróis. Vários alunos, exímios em decorar questionários, tinham fama de superdotados, de crânios. Fora da escola, quando eram postos a teste na vida real, sem o auxílio dos questionários, quase sempre fracassavam. Muitos deles sequer entendiam o porquê de terem passado de super alunos para mero coadjuvantes.

 
Nunca fui um aluno brilhante, tirava notas medianas, na área de exata minhas notas eram sofríveis. Mas sempre tive a compensação de me esforçar para estar bem informado e atualizado. Fazia parte de um grupo de adolescentes que, mesmo tirando notas medianas ou abaixo da média, discutia sobre política, música de qualidade, poesia. Enquanto os outros apenas assistiam aos filmes, nós assistíamos, discutíamos sobre a direção, roteiros, atores. Os decorebas não sabiam dessas coisas, afinal, após os filmes não tinha questionários para eles decorarem.


Os falsos instruídos eram como o Efenólogo”. Explico: diz uma fábula que existia um homem inteligentíssimo e muito instruído, sabia muito. Falava sobre florestas, sobre a França, sobre o fogo, sobre Francisco Ferdinando, entendia sobre fokstrot, fauna, feijão, fumo, fazendas, falsidade, fábricas... Um dia perguntaram-lhe: "Quem foi Arquimedes?". Ele pensou e não respondeu. Todos estranharam, o sabichão não sabia. Sua “erudição” era segmentada. Ele havia cumprido pena por assalto, passou dez anos na prisão. Tinha como companheiro de cela, um homem que guardava consigo uma enciclopédia. O tal homem ganhou liberdade e acabou esquecendo os volumes da enciclopédia referentes a letra “F”. Ele decorou tudo e virou um “efenólogo”, um especialista em assuntos da letra efe.


Os decoradores de questionário da minha época de escola eram todos efenólogos, tinham habilidades parciais, não estavam preparados para a vida. Esse universo anti-holístico produziu imensas distorções na escola tradicional e fez a tristeza de muita gente. É por isso que sempre digo: informação é poder.

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